CANTIGA DE ABRIL
Às Forças Armadas e ao povo de Portugal
«Não hei-de morrer sem saber qual a cor da
liberdade»
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase,
quase cinquenta anos
Reinaram
neste pais,
E à
conta de tantos danos,
De
tantos crimes e enganos,
Chegava
até à raiz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Tantos
morreram sem ver
O dia
do despertar!
Tantos
sem poder saber
Com
que letras escrever,
Com
que palavras gritar!
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essa
paz de cemitério
Toda
prisão ou censura,
E o
poder feito galdério.
Sem
limite e sem cautério,
Todo
embófia e sinecura.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esses
ricos sem vergonha,
Esses
pobres sem futuro,
Essa
emigração medonha,
E a
tristeza uma peçonha
Envenenando
o ar puro.
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Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essas
guerras de além-mar
Gastando
as armas e a gente,
Esse
morrer e matar
Sem
sinal de se acabar
Por
politica demente.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esse
perder-se no mundo
O
nome de Portugal,
Essa
amargura sem fundo,
Só
miséria sem segundo,
Só
desespero fatal.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase,
quase cinquenta anos
Durou
esta eternidade,
Numa
sombra de gusanos
E em
negócios de ciganos,
Entre
mentira e maldade.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Saem
tanques para a rua,
Sai o
povo logo atrás:
Estala
enfim altiva e nua,
Com
força que não recua,
A
verdade mais veraz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Jorge de Sena, 26-28/4/1974
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